Free cookie consent management tool by TermsFeed Generator

Como é nascer em uma casa de parto no Brasil

Centros de Parto Normal Peri-hospitalares são vinculados ao SUS e apresentam indicadores impressionantes a respeito das melhores práticas recomendadas pela OMS e pela ciência. 96,9% foram feitos por enfermeiras obstétricas ou obstetrizes, prescindindo de um médico

16.07.2025

Nascimento no CPNp Davi Capistrano, do Hospital Sofia Feldman, em Minas Gerais (Foto: Hospital Sofia Feldman)

O Brasil amarga uma taxa de partos por cesariana muito acima do que o necessário. São 59,6% dos nascimentos, percentual distante do recomendado pela OMS, entre 10% e 15%. Isso se dá, sobretudo, por uma “cultura hospitalocêntrica, medicalizada e médico-centrada” que não tem base científica e não se mostra mais eficaz ou mais segura. É o que pontua o artigo “Indicadores de monitoramento e avaliação dos Centros de Parto Normal Peri-hospitalares: resultados do estudo Nascer nas Casas de Parto do Brasil”, publicado na revista Cadernos de Saúde Pública, vinculada à Fiocruz, parceira editorial do Outra Saúde.

As pesquisadoras analisaram uma experiência que se coloca no oposto da lógica de parto hospitalar: os Centros de Parto Normal Peri-hospitalares (CPNp) do Brasil. São unidades de saúde voltadas a nascimentos de risco habitual, que têm como objetivo “proporcionar um ambiente acolhedor e seguro, onde as gestantes podem vivenciar o parto de forma humanizada e com o mínimo de intervenções”. Hoje, há apenas oito no país, mas os indicadores evidenciados pelo estudo mostram que são fundamentais para garantir saúde às mães e bebês.

O Brasil ainda está longe de alcançar a meta de redução da mortalidade materna estabelecida para 2030: é preciso que caia abaixo de 30 mortes por 100 mil nascidos vivos, mas a razão ainda é de 68,1. Segundo o Ministério da Saúde, solucionar esse problema passa tanto por melhorar a frequência e qualidade do pré-natal quanto garantir uma assistência ao parto digna

As Casas de Parto foram regulamentadas em 2015 mas, dez anos depois, só estão presentes em sete unidades da federação: São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Pernambuco, Bahia, Pará e Distrito Federal. Espera-se que o cenário já esteja começando a mudar: o governo Lula incrementou recursos, via Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), para a construção de 30 novos centros de parto normal até 2026.

Evidências de que os CPNp seguem os melhores parâmetros e oferecem um bom atendimento às mães e aos recém-nascidos ficam muito claras nos números. No período de um ano, os oito centros registraram 3.097 partos. 96,9% foram feitos por enfermeiras obstétricas ou obstetrizes, prescindindo de um médico, fato que “está associado a maiores chances de parto vaginal espontâneo e satisfação materna, bem como de menor taxa de partos instrumentais, redução de nascimentos pré-termos e de perdas e mortes fetais e neonatais”, segundo o estudo. 

presença de acompanhante, outro fator essencial para garantir segurança e conforto às mulheres na hora do parto, aconteceu em 98,7% dos casos. Embora esse indicador esteja melhorando de forma geral, “a relevância deste dado se deve ao fato de instituições hospitalares ainda restringirem ou até impedirem a presença de acompanhantes”, pontuam as pesquisadoras. 

Menos intervenções desnecessárias

As casas de parto também registram menores taxas de intervenções no parto. Nesse quesito, fica claro como se distanciam da lógica médica e do que acontece na maior parte dos hospitais brasileiros. Por exemplo, a episiotomia, procedimento cirúrgico em que se realiza um corte no períneo para ampliar a abertura vaginal, não é recomendada e não há evidências de que é necessária, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). No entanto, a pesquisa Nascer no Brasil I descobriu que, nos hospitais avaliados, a prática está presente em 56% dos partos – já bastante acima dos 10% recomendados pela OMS. Enquanto isso, nas casas de parto normal, a episiotomia é realizada em apenas 0,4% das parturientes.

Outros dois procedimentos foram feitos em números reduzidos nas CPNp: a amniotomia (ruptura artificial da bolsa amniótica) e a estimulação com ocitocina (hormônio que aumenta as contrações uterinas). A média foi de 15,7% e 7%, respectivamente – nos hospitais brasileiros, chega a 40,7% e 38,2%. As duas intervenções devem ser feitas apenas quando estritamente necessário, recomenda a OMS.

A posição da mãe no momento do parto também foi analisada pelo estudo Nascer nas Casas de Parto do Brasil. Em geral, se pratica a posição litotômica nos hospitais: aquela em que a mulher fica deitada na maca, com as pernas elevadas. Mas ela também não é aconselhada pela OMS, que recomenda que a posição seja escolhida pela mulher. Mais uma vez, números devastadores nas maternidades em geral: apenas 6,7% dos partos são feitos em posições verticalizadas, as mais recomendadas por trazerem benefícios tanto para a mãe quanto para o bebê. Nos CPNp, são regra: 60,2% dos bebês nascem de partos em posição vertical.

Um modelo de sucesso, inexplorado

Ou seja, o modelo das casas de parto brasileiras, vinculadas ao SUS, oferece “às mães e bebês uma assistência segura, respeitosa, humano-centrada e baseada nas melhores evidências científicas”… Mas ainda assim são subutilizadas. O estudo constatou que os CPNp registraram em média, uma ocupação de apenas 48,5% de sua capacidade mensal. Segundo as pesquisadoras, a hipervalorização das cesarianas e a percepção de que o parto com menos risco é aquele feito nos hospitais “retira das parturientes e bebês saudáveis a possibilidade de vivenciarem seus partos e nascimentos em um CPNp, instituição cujo ambiente e assistência são seguros e apoiados pelas melhores evidências científicas”.

O artigo reconhece que as recentes mudanças na atenção materna e infantil promovidas pelo Ministério da Saúde, com a chamada Rede Alyne, começam a dar passos importantes. “Houve ênfase na urgência de implementação de um novo modelo de cuidado obstétrico e perinatal para a redução da mortalidade materna no país (especialmente da população negra) e para o alcance dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável”, pontuam. Em uma iniciativa da sociedade civil, a Rede Nacional Feminista de Saúde lançou, recentemente, um manifesto chamado “Reforma obstétrica já!”, que reforça a urgência dessas mudanças. São passos importantes, e os Centros de Parto Normal Peri-hospitalares podem ser um instrumento essencial para alcançar as mudanças necessárias.

Fonte: Outra Saúde - Gabriela Leite

Compartilhe

Outros Artigos

Receba nossas novidades! Cadastre-se.


Fale Conosco

 

Conselho Federal de Enfermagem

Entrequadra Sul 208/209, Asa Sul, CEP:70390-100

61 3329-5800 | FAX 61 3329-5801


Horário de atendimento ao público

De segunda a sexta, das 8h às 12h e das 13h às 17h

Contato dos Regionais