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PARECER Nº 31/2025/CÂMARAS TÉCNICAS DE ENFERMAGEM


21.07.2025

PROCESSO Nº 00196.005174/2024-02

ELABORADO POR: CÂMARA TÉCNICA DE LEGISLAÇÃO E NORMAS DE ENFERMAGEM

ASSUNTO: PROCEDIMENTO DE OTOMODELAÇÃO.

 

 

Parecer técnico sobre a atuação do enfermeiro especialista em estética na realização do procedimento de otomodelação com fios absorvíveis de PDO, incluindo o uso de anestésico local. Análise das prerrogativas legais e técnicas para a execução do procedimento no âmbito da Enfermagem Estética.

 

1. INTRODUÇÃO

1. A consulente formulou consulta técnica junto à Ouvidoria do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) acerca da possibilidade de enfermeiros realizarem o procedimento de otomodelação com uso de anestesia local (lidocaína com ou sem vasoconstritor) e fios de sustentação (PDO). A consulta questiona, essencialmente, se tais procedimentos se enquadram nas competências legais e éticas da Enfermagem Estética, conforme disciplinado pelas resoluções do Cofen. Além disso, outra questão levantada refere-se ao fato de que sendo a otomodelação um procedimento definitivo demandaria uma análise aprofundada quanto à segurança, capacitação e limites éticos para a prática pelo profissional enfermeiro.

 

2. FUNDAMENTAÇÃO E ANÁLISE 

Atuação do enfermeiro em procedimentos estéticos:

2. A Lei nº 7.498/1986 e o Decreto nº 94.406/1987 regulamentam o exercício da Enfermagem, atribuindo ao enfermeiro a execução de atividades de maior complexidade técnica, desde que compatíveis com sua formação e competência legal. Para tanto, foi publicada a Resolução Cofen Resolução Cofen nº 529/2016, alterada pela Resolução Cofen nº 626/2020, que atualizou o marco normativo da Enfermagem Estética e autorizou enfermeiros especialistas a realizarem procedimentos estéticos minimamente invasivos não cirúrgicos, desde que tais atos não estejam previstos como de competência exclusiva do profissional médico, nos termos da Lei nº 12.842/2013 (Lei do Ato Médico).

3. Ressalta-se que a Resolução Cofen nº 529/2016 foi objeto de impugnação judicial na Ação Civil Pública nº 0804210-12.2017.4.05.8400, em trâmite na Justiça Federal do RN, ajuizada por entidades médicas contra o COFEN. O TRF5, em acórdão relatado pelo Desembargador Federal Paulo Roberto de Oliveira Lima, suspendeu os efeitos da Resolução COFEN nº 529/2016 apenas quanto a determinados procedimentos estéticos: Micropuntura, Laserterapia, Depilação a laser, Criolipólise, Escleroterapia, Intradermoterapia/Mesoterapia, Prescrição de Nutracêuticos/Nutricosméticos e Peelings. Ficaram, entretanto, expressamente excluídos da suspensão judicial, outros procedimentos estéticos minimamente invasivos que não configurem atos médicos privativos, como a carboxiterapia e micro pigmentação.

4. A tese jurídica, realizada por meio de uma interpretação distorcida da regra legal, sustentada pelo Conselho Federal de Medicina e pelas Associações Médicas para criar obstáculo desproporcional e desarrazoado à prática de procedimentos estéticos pelo profissional de enfermagem está contida especificamente no inciso III do art. 4º da Lei 12.842, de 10 de julho de 2013 que estabelece como atividades privativas do médico “indicação da execução e execução de procedimentos invasivos, sejam diagnósticos, terapêuticos ou estéticos, incluindo os acessos vasculares profundos, as biópsias e as endoscopias”. (g.n.)

5. Através de uma interpretação sistemática do referido diploma legal, encontramos a definição expressa do que vem a ser procedimento invasivo no §4º do art. 4º, vejamos:

§ 4º Procedimentos invasivos, para os efeitos desta Lei, são os caracterizados por quaisquer das seguintes situações: I – (VETADO); II – (VETADO);

III – invasão dos orifícios naturais do corpo, atingindo órgãos internos. (g.n.)

6. Além disso, conforme se extrai dos incisos II e VI do artigo 4º do mencionado diploma legal, apenas os procedimentos estéticos que envolvam intervenção cirúrgica, sedação profunda, bloqueios anestésicos e anestesia geral estariam vedados ao profissional de enfermagem por força dos referidos dispositivos normativos, pois tais condutas são privativas do médico, ressalvado o que está estabelecido no art. 11, parágrafo único, alínea “c” da Lei 7.498/86 que estabelece que incumbe ao profissional enfermeiro obstetra a realização da episiotomia – considerada um procedimento cirúrgico -, entretanto, o §7º do art. 4º da Lei 12.842/13 resguardou as competências próprias do profissional de enfermagem. Dessa forma, considerando uma interpretação sistemática e literal da Lei 12.842, de 10 de julho de 2013, é possível afirmar que os procedimentos estéticos que são vedados aos profissional enfermeiro são aqueles que possuem qualquer das seguintes características:

a) necessite de procedimento cirúrgico;

b) invada orifícios naturais do corpo atingindo órgãos internos: procedimentos invasivos;

c) necessitem de sedação profunda;

d) necessitem de anestesia geral.

7. A partir destes parâmetros normativos é possível definir, com precisão, quais procedimentos estéticos podem ser realizados por profissionais de enfermagem devidamente capacitados conforme as normativas que regulamentam o exercício profissional para uma prática segura de enfermagem livre de imperícia.

8. É justamente nesse sentido que a Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, inciso XIII, limitando o poder estatal, assegurou ao particular a liberdade de exercer qualquer trabalho, ofício ou profissão, desde que respeitadas as qualificações que a lei estabelecer, logo, o profissional de enfermagem não estaria atuando ilegalmente desde que respeitados os parâmetros expressos extraídos da Lei 12.842/13, conforme esclarecido anteriormente.

Otomodelação por Enfermeiros: 

9. A otomodelação é a remodelação da cartilagem auricular com finalidade estética ou corretiva, utilizando técnicas não invasivas (como dispositivos moldadores externos) ou minimamente invasivas, com o uso de fios de tração ou bioestimuladores. Para LACERDA et al, a otomodelação é uma técnica inovadora utilizada […] para correção da “orelha de abano” que tem como principais características não ter incisões ou raspagens a nível de cartilagem, utilizando de transfixação subcutânea de fios inabsorvíveis e permanentes, possibilitando um resultado mais promissor e com mais vantagens ao profissional e paciente.

10. Conforme consta no Parecer Técnico nº 13/2025 da Câmara Técnica de Pareceres Técnicos do Coren-PR reconhece que a otomodelação externa (ex. com EarWell®) pode ser conduzida por enfermeiros estetas, especialmente em neonatos, desde que respeitados os princípios éticos e a devida capacitação. Nesse sentido, como a otomodelação é considerada um procedimento não cirúrgico e, conforme o conceito extraído da Lei 12.842/13, não invasivo, conclui-se que não está, atualmente, vedado ao profissional enfermeiro devidamente capacitado, quando realizado o procedimento estético em ambiente que preencha os requisitos sanitários que garantam ao paciente um procedimento seguro.

Uso de anestésico local (lidocaína):

11. Diversos pareceres técnicos emitidos pelo Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) têm consolidado o entendimento de que o uso de anestésico local injetável por enfermeiros é permitido em procedimentos minimamente invasivos, desde que observados critérios técnicos, éticos e legais. No contexto de alguns procedimentos de Enfermagem, o Parecer Técnico Cofen nº 22/2018 e o Parecer Técnico Cofen nº 32/2018 reconhecem a possibilidade de utilização de lidocaína sem vasoconstritor por enfermeiros, desde que atendidos os seguintes requisitos:

• o profissional possua formação específica na área de atuação e capacitação técnica para a execução do procedimento;

• o ambiente disponha de estrutura física adequada e suporte ambulatorial para manejo de intercorrências;

• seja respeitada a posologia segura, com o monitoramento clínico do paciente durante e após a administração.

Portanto, à luz dos pareceres técnicos do Cofen e da ausência de impedimento legal ou jurisprudencial quanto ao uso de anestésico local em procedimentos minimamente invasivos, conclui-se que o enfermeiro, desde que capacitado e atuando dentro dos limites éticos e técnicos, possui competência para realizar a anestesia local necessária à execução do procedimento de otomodelação.

Aplicação de fios absorvíveis (PDO):

12. Conforme o Parecer Cofen nº 001/2022/GTEE, a aplicação de fios PDO não está entre os procedimentos suspensos pela decisão judicial da ACP 0804210-12.2017.4.05.8400. O procedimento é permitido a enfermeiros desde que não haja invasividade profunda e que sejam observadas:

• formação em curso reconhecido;

• registro da especialização em Estética no Coren competente;

• garantia de respaldo técnico-científico da técnica empregada.

13. Por sua vez, o Coren-PB, por meio do Parecer Técnico/Consulta n.º 01/2024 – Comissão de Enfermagem Estética e Empreendedorismo, assim se posicionou sobre o uso dos fios de polidioxanona (PDO):

“Segundo a literatura, os fios de polidioxanona (PDO) são amplamente utilizados para fins estéticos por serem biodegradáveis e causarem baixa reação inflamatória entre o tecido e o fio (Araújo et al., 2017).”

“A escolha do tipo de fio – absorvível, inabsorvível ou monofilamentar multifilamentar depende de vários fatores, incluindo o tempo de cicatrização e a tensão suportada pelos tecidos (Meideiros et al., 2017). A literatura afirma que o uso dos fios de tração e sustentação dérmica facial tem sido muito empregado na reabilitação facial estética por ser uma alternativa de tratamento pouco invasiva e com um custo baixo em relação às alternativas mais invasivas. Não apresenta caráter alergênico nem piogênico, sendo ideais para a técnica por serem atraumáticos e apresentaram alta biocompatibilidade com os tecidos humanos (Araújo et al., 2017).”

 

14. Diante desses apontamentos literários, assim concluiu o Coren-PB:

“Por isso, o procedimento de otomodelação com fio de PDO se apresenta como uma solução não cirúrgica para corrigir a aparência das orelhas, sem deixar cicatrizes, de fácil acesso, baixo custo e tempo curto de recuperação.”

15. Nesse sentido, a CTLNENF, utilizando os argumentos científicos apresentados pelo Coren-PB, conclui que o enfermeiro capacitado e em ambientes adequados tem competência para utilização de fios de PDO na realização do procedimento de Otomodelação, vez que também não há vedação legal contida na lei 12.842/13.

 

3. CONCLUSÃO

16. Diante da legislação vigente, das manifestações técnicas dos Conselhos Regionais e Federal de Enfermagem, da literatura nacional e estrangeira, e da jurisprudência aplicável, esta Câmara Técnica entende que a otomodelação, com uso, ou não, de anestesia local, bem como uso de fios de PDO, pode ser realizada por enfermeiros especialistas, desde que o profissional respeite os seguintes requisitos cumulativos:

  • possua especialização reconhecida em Enfermagem Estética;
  • utilize técnica respaldada cientificamente;
  • não realize procedimentos de natureza cirúrgica;
  • não utilize sedação profunda, bloqueios anestésicos e anestesia geral;
  • realize a otomodelação em ambiente que respeite as normas sanitárias;
  • proceda com o consentimento informado do paciente/cliente.
  • seja realizada avaliação profissional e registro em prontuário.

17. Soma-se a isso que o uso de lidocaína sem vasoconstritor em procedimentos estéticos minimamente invasivos é permitido ao profissional enfermeiro, conforme exposto.

18. Recomenda-se que o profissional que realize tais atos, mantenha registro documental dos atendimentos e do consentimento informado, bem como atue sempre com base nos princípios éticos, legais e técnicos da profissão, garantindo ao paciente/cliente uma assistência de enfermagem livre de imperícia, imprudência e negligência.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição Federal, 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 12 mar. 2025. BRASIL. Lei nº 7.498/86, que dispõe sobre a regulamentação do exercício da enfermagem, e dá outras providências. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7498.htm. Acesso em 04 maio. 2025. BRASIL.

Lei nº 94.406/87, que regulamenta a Lei nº 7.498, de 25 de junho de 1986, que dispõe sobre o exercício da enfermagem, e dá outras providências. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1980-1987/decreto-94406-8-junho-1987 444430-publicacaooriginal-1-pe.html. Acesso em 04 maio. 2025.

BRASIL. Lei nº 12.842/13, que dispõe o exercício da medicina. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12842.htm. Acesso em 04 maio. 2025. BRASIL. Conselho Federal de Enfermagem.

Resolução COFEN nº 626, de 20 de fevereiro de 2020, que altera a Resolução Cofen nº 529, de 9 de novembro de 2016, que trata da atuação do Enfermeiro na área de Estética, e dá outras providências. Disponível em: www.portalcofen.gov.br. Acesso em: 05 maio 2025. BRASIL. Conselho Federal de Enfermagem.

Parecer Técnico Cofen nº 22/2018/CTLN. Legislação profissional: administração de “botão anestésico” e realização de anestesia local injetável por enfermeiro. Brasília, 29 ago. 2018. 1 p. Disponível em: http://www.cofen.gov.br/parecer-n-22-2018-cofen-ctln_66439.html.

Parecer de Câmara Técnica nº 32/2018/CTLN/COFEN. Administração de anestésico lidocaína sem vasoconstritor em casos de picada por animal peçonhento. Brasília, 5 fev. 2019. Disponível em: http://www.cofen.gov.br/parecer-n-32-2018-cofen-ctln_68479.html.

Conselho Regional de Enfermagem da Paraíba. Parecer Técnico/Consulta nº 01/2024 – Comissão de Enfermagem Estética e Empreendedorismo. Disponível em: https://www.cofen.gov.br/parecer-de-camara-tecnica-no-001-2022-gtee-cofen/. Acesso em: 6 maio. 2025. Pareceres BRASIL.

Conselho Regional de Enfermagem do Paraná. Parecer nº 13/2025/Câmara Técnica de Técnicos. Disponível em: https://ouvidoria.cofen.gov.br/coren pr/transparencia/129149/download/PDF. Acesso em: 6 maio. 2025. LACERDA VALVERDE, K.; MAFRA CERIBELLI, B.; MARIA SILVA MOREIRA, K. OTOMODELAÇÃO: UMA TÉCNICA INOVADORA PARA A CORREÇÃO DA “ORELHA DE ABANO”. Aesthetic Orofacial Science, [S. l.], v. 4, n. 3, p. 39–45, 2023. DOI: 10.51670/aos.v4i3.160. Disponível em: https://ahof.emnuvens.com.br/ahof/article/view/160. Acesso em: 7 maio. 2025.

 

Parecer elaborado e discutido por: Dr. Jebson Medeiros Martorano, analisado, corrigido e aprovado pelos membros da CTLNENF: Dr. Antonio Francisco Luz Neto, Dra. Natália Augusto Rodrigues Bortolotti, Dr. Jorge Domingos Sousa Filho, Dr. Osvaldo Albuquerque Sousa Filho e Dra. Cleide Mazuela Canavezi.

 

Parecer aprovado na 578ª Reunião Ordinária de Plenário em 27 de junho de 2025.

 

Documento assinado eletronicamente por:

Dr. Antônio Francisco Luz Neto – Coren-PI 313.978- ENF, Coordenador(a) da Câmara Técnica de Legislação e Normas de Enfermagem, em 08/07/2025.

Dr. Jebson Medeiros Martorano – Coren-AC 95.621 – ENF, Membro da Câmara Técnica de Legislação e Normas de Enfermagem, em 08/07/2025.

Dra. Natalia Augusto Rodrigues Bortolotti – Coren-SP 211.931-ENF, Membro da Câmara Técnica de Legislação e Normas de Enfermagem, em 08/07/2025.

Dra. Cleide Mazuela Canavezi – Coren-SP 386.882-ENF, Membro da Câmara Técnica de Legislação e Normas de Enfermagem, em 08/07/2025.

Dr. Osvaldo Albuquerque Sousa Filho – Coren-CE 56.145-ENF, Membro da Câmara Técnica de Legislação e Normas de Enfermagem, em 08/07/2025.

Dr. Jorge Domingos de Sousa Filho, Coren-RO 111.710-ENF, Membro da Câmara Técnica de Legislação e Normas de Enfermagem, em 08/07/2025.

 

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